sexta-feira, fevereiro 09, 2007

"Só a cerveja tira os demônios das pessoas" e a Lavagem de Itapuã

Só Jesus tira os demônios das pessoas um caralho! Lembra aquela época, lá na tenra infância, quando a mamãe quase te obrigava a mijar pela manhã, mesmo se você tivesse acordado 15 vezes durante a noite para tal fim, porque "eliminava toxinas"? Então. Toxinas fazem mal ao organismo. Então, toxinas são o demônio! Ou, pelo menos, são agentes deles. E tem maneira melhor de mijar desesperadamente (e consequentemente, expulsar milhares de toxinas do seu corpo) que encher a cara de cerveja? Por isso, à partir deste momento, inicio a Igreja da Santa Bohemia dos Antepenúltimos Dias. Porque só a cerveja expulsa os demônios das pessoas!*

+++

Para aqueles que não estão familiarizados com os baianos e seus curiosos hábitos, aqui temos duas "lavagens" ao ano, sempre em janeiro e fevereiro. Originalmente, era uma espécie de ritual religioso, onde as principais igrejas da cidade (A Igreja do Nosso Senhor do Bonfim e a Igreja de Itapuã, esta última sendo lamentavelmente perto de onde moro) eram lavadas e purificadas como uma forma de adoração e respeito pelos locais sagrados. Hoje em dia, não passam de festivais que os líderes católicos classificariam como pagãos - e eu, como pagã, me envergonho tremendamente disso. A tal lavagem é meramente simbólica, e, pelo estado que a cidade fica, a impressão é que recebe esse nome porque as ruas viram verdadeiros chiqueiros, só que mais sujos.

Há trios elétricos tocando o que há de pior e mais vulgar do pagode, pessoas trêbadas e diversos homens-aborígenes, dispostos a tudo para agarrar uma periguete. Os principais requisitos para tomar parte nesta comemoração são a total falta de senso de ridículo, a ausência de senso estético e a completa alienação que caracteriza aqueles que não perdem "um bom pagode" por nada desse mundo. Juro para vocês que, há cerca de quatro horas, quando a folia começava a se dissipar e eu e o namorido nos arriscamos a sair de casa pra comer esfihas e pastéis, vi uma mulher de micro-short (tipo Carla Perez antes de virar evangélica) branco com um cinto de lantejoulas douradas, mini-micro-top-sutiã branco e sandálias douradas pra combinar. O cúmulo da falta de senso de moda, pelo amor dos Deuses!

Além disso, como eu disse, as ruas parecem chiqueiros. Saindo do Habib's e indo em direção ao posto, onde íamos comprar cervejas e chocolates para compensar a falta de RPG (é, ia ter jogo hoje, não teve porque ficamos ilhados graças à lavagem! É o cúmulo do absurdo!), passamos diante do paredão do mijo - contei uns 6 rapazes, todos de abadá (é, vendem-se abadás para essa suposta festa), mijando apoiados na parede que separa nossa lanchonete preferida (por ser a mais próxima) do posto de gasolina que sempre me salva quando meu cigarro acaba às 4 da manhã e eu começo a ter crises de abstinência.

As ruas exalavam um forte fedor de mijo, vômito, cerveja, álcool etílico potável (a.k.a. cachaça vagabunda) e churrasquinhos e podrões diversos. Me senti num flashback, onde eu novamente morava no Rio e estava atravessando a Vila Mimosa para chegar ao Garage. Infelizmente, após atravessar a imundície, não cheguei a um lugar igualmente fedorento mas cheio de gente legal, com bebida barata (ou bebida com baratas, no Garage nunca se sabe) e tocando um bom Metal, ou Hard Rock, ou Grunge no último volume. Felizmente, apesar de não ter o odor característico e nem o som tão alto, meu quarto é aconchegante e estava bem fornido de cervejas graças aos nossos esforços.

Com isso tudo, faço a mim mesma uma promessa: no ano que vem, na segunda quinta-feira de fevereiro, estarei bem longe daqui. Do outro lado da cidade, na casa da melhor amiga, no mínimo. De preferência, do outro lado do país, conhecendo o Acre (hã? E ele existe?**) ou visitando a família do namorado no Rio Grande do Sul. Ou mesmo vendo meus amiguinhos lá no Rio, já que há quatro anos prometo uma visita e já conheci o país inteiro, mas não tornei a pisar lá. Mas ficar presa em Itapuã no dia da lavagem, nunca mais.

+++

* Texto escrito sob forte influência das 3 latinhas de Skol tomadas. Ainda tem mais duas na geladeira, acho que vou encarar.
** Se tenho algum leitor do Acre, me perdoe a piada. É inevitável. Aproveite e me mande histórias do Acre! Pode ser que eu não acredite em você, mas é sempre divertido ouvir lendas!

Marcadores: ,